sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

Confraria da Leitura-pn Edição 18

Pinheiro Neto (poetapinheironeto@gmail.com)


O POEMA E EU



Dar um depoimento sobre minha prática cotidiana enquanto “poeta” não é uma coisa muito simples para mim. Acredito que não deva ser também para muitos escritores. Mas vamos lá. Vou tentar.
Começo com alguns questionamentos: Será que sou um poeta na verdadeira acepção da palavra? Será que posso considerar-me um? O que é, afinal, ser poeta?
Há quarenta e cinco anos, um pouco mais, um pouco menos, venho registrando minhas impressões, meus sentimentos, minhas (re)visões do mundo através de trovas, poemas visuais, poemas livres, etc.
Se poesia, originariamente do grego poíesis significa fazer, indicando, por conseguinte que “poeta é aquele que faz versos”, prefiro me ver como um “fazedor de versos” que utiliza a metáfora, as imagens, as comparações. Sou, portanto, segundo Manuel da Fonseca (Poemas completos, p.26), um dentre os muitos “que têm olhos de água” justamente “para reflectirem todas as cores do mundo e as formas e as proporções exactas, mesmo das coisas que os sábios desconhecem”.
Desde que comecei essa caminhada, muito antes de Iriamar (1978) não tenho me preocupado em construir poemas utilizando uma “linguagem literariamente correta ou bonita” mas em transportar para o papel o que pode estar recôndito no íntimo do ser humano e do (m)eu corpo humano. Assim, não tenho tratado o poema com a preocupação de elaborar nas suas entrelinhas um conjunto de normas poético-literárias, mas em trabalhar o poema perquirindo sua essência, isto é, enquanto veículo que apresenta a poesia como “paragem das palavras sobre algo” (Teresa Guedes em Ensinar a poesia, p. 34). Como algo necessário à vida e ao cotidiano das pessoas em geral e dos estudantes – principalmente aqueles entre 7 e 14 anos – em particular.
Na poesia a linguagem é poder que se exerce sobre o imaginário. Nas nossas escolas tolera-se livres incursões imaginárias apenas no período da pré-escola ao se trabalhar a educação sensorial. Após essa fase, a tendência é reprimir qualquer manifestação que esteja fora da linguagem articulada.
Mas, o que queremos? Se nossos cursos de formação de profissionais para o ensino de Língua e Literatura não “perdem tempo” com o ensino da poesia, como querer que os alunos que se formarão professores aprendam a gostar e a trabalhar a Língua através desse gênero literário?
É preciso iniciar um processo sistematizado de desmistificação da poesia, quer em nível de professores, quer em nível de alunos.
De uma maneira geral, deveremos pensar em um ensino da poesia nas escolas que traga como alvo: o desenvolvimento do poder criador da criança; o desenvolvimento da imaginação e da sensibilidade; a iniciação da criança no contexto da arte em geral, além da formação do sentido estético dessa criança.
Bem, divagações à parte. Cabe-me falar um pouco sobre como se dá concretamente o processo criativo no meu cotidiano.

Não tenho nenhuma questão mais sofisticada em minha relação com a produção de meus textos, sejam eles poesia ou prosa. Existe primeiramente uma motivação. Preciso ser motivado. Tal motivação pode ser externa ou interna. A externa pode vir através de observação da natureza, de fatos sociais, de conversas entre pessoas, de teatro, cinema, vídeo, tv, etc. Já a interna aflora a partir do estado de espírito em que me encontro em determinados momentos.
Para Kahlil Gibran (Cartas de amor do profeta p. 97) “os poetas têm que escutar o ritmo do mar. Quando ouvimos esse ritmo, algo mais surge além dos sons, pois a cada nova onda que quebra na areia com toda a sua força e densas espumas, uma pequena marola volta para o oceano produzindo um barulho secundário. Aí, uma outra onda encontra-se com essa marola, vem uma nova onda e o fluxo e o refluxo continuarão para sempre. E não importa o momento em que sentamos à beira da praia pela primeira vez.Ele afirma que “esta é a música que precisamos aprender – as coisas sempre vão e vem.”
Como um “fazedor de versos”, agradeço todos os dias ao Pai Eterno e aos meus pais por ter nascido nesta Ilha e aprendido, ainda muito cedo, a ouvir o ritmo do mar.
Quanto a local, hora, momentos melhores para escrever, não há preferências. Escrevo a qualquer hora e em qualquer lugar. Basta haver uma motivação.
È importante ressaltar que esse “escrever a qualquer hora e em qualquer lugar, desde que motivado”, não significa que a obra sai pronta e acabada. Essa motivação me impulsiona a efetuar os primeiros registros, os primeiros apontamentos para posterior trabalho mais acurado.
Geralmente guardo esses registros por um bom tempo. Não sou um escritor apressado. Em outro casos não, a coisa em si toma outras feições. A motivação é tão intensa que a vontade de aprofundar e de ver o texto pronto me faz trabalhar incessantemente. Me faz querer burilá-lo, mexer em sua estrutura, concluí-lo.
É por isso que experimento sempre. Que procuro buscar novas roupagens poéticas para meus poemas. “Todas as coisas são belas, e se tornam ainda mais belas quando não temos medo de conhecê-las e experimentá-las. A experiência é a Vida com asas.” (Kahlil Gibran, p. 64)
Hoje não existe um padrão geral definido que caracterize as artes e as letras, como no Romantismo, Realismo ou outros momentos literários. Não há dogmas, regras ou normas a serem seguidas ou respeitadas com rigidez. O verso livre está posto porém, se eu quiser, posso publicar um livro de sonetos. O que existe hoje é justamente a busca do novo, do original. Tudo já foi dito, tudo já foi escrito. É preciso dizer ou escrever de uma maneira nova, original; de uma maneira compatível com a realidade deste mundo e de um homem globalizado e interdisciplinar.









PONTO DO POETA

Acéfalo sigo
Pela minha vida
(per)correndo poemas.
Não são meus
Os versos, as rimas,
As letras, as palavras.
Não é meu o poema.

(Ensaio C, pg. 69, do livro Chrischelle, 1979)

3 comentários:

  1. Pinheiro:
    Não vou comentar teu trabalho, já que acompanhei de perto Iriamar (lembra que participei da capa?). Basta dizer que, seguindo Gullar, "o poema, antes de escrito, não é mais do que um aflito silêncio, ante a página em branco". Exerçamos, então, este sagrado dever da angústia na busca do dizer o indizível. É nosso "pathológico" (de pathos) e demoníaco (de daimon) destino.
    Uma pergunta: Como fazer para inserir (gostaria que desses uma olhada) alguns trabalhos meus?
    Abraços do Luiz de Freitas,

    ResponderExcluir
  2. Luizpi, envie o(s) teu(s) trabalho(s) para poetapinheironeto@gmail.com
    abs

    ResponderExcluir
  3. Que lindo...
    Não comento,aprecio!
    Abraço fraterno,querido Liberato.
    Walnélia

    ResponderExcluir