quarta-feira, 14 de outubro de 2015

Edição nº. 74/75

PAPO NA CONFRARIA: LUIZ ANTÔNIO CARDOSO






1 – O que te motivou a escrever?

A motivação surgiu com a possibilidade de registrar parte da Memória das atividades de Prevenção de Incêndios, das quais participei por 20 anos, enquanto servia no Corpo de Bombeiros de Santa Catarina.

2 – Cite 3 livros (e respectivos autores) mais significativos em tua vida.

Os 3 livros mais significativos, que li durante a adolescência:

    - Como era verde o meu Vale: Richard Llewellyn;
    - Por quem os sinos dobram?: Ernest Hemingway;
    - Olhai os lírios do campo: Érico Veríssimo.

3 – Indique um livro (Literatura Brasileira) para a leitura de:

a)   Alunos do Ensino Fundamental: O Guarani- em quadrinhos (José de Alencar)

b)   Alunos do Ensino Médio: Verde vale (Urda Alice Klueger)


c)   Alunos do Ensino Superior: Senhora (José de Alencar)

4 – Como se dá o processo da escrita em tua prática cotidiana?

Durante a semana procuro organizar um fluxo de produção que não dispute espaço na agenda com outros compromissos, evitando sentar para escrever e ficar controlando o relógio para não perder os compromissos. No final de semana, inverto a lógica, insiro outras atividades nos intervalos de tempo, para oxigenar a mente.

5 – Fale sobre o apoio dispensado pelos setores público e privado à literatura.

Numa pátria que se diz “Educadora” é vergonhoso falar sobre o apoio do setor público, que cobra impostos sobre produções e aquisições de obras literárias; quanto ao setor privado, ainda está longe o engajamento de grupos que invistam na literatura, sem que lhes sejam oferecidas vantagens financeiras. Ler e escrever custa caro e desestimulam os investimentos pessoais.

6 – Fale sobre o papel das Academias de Letras em relação à Língua e à Literatura.

Em relação à Língua e à Literatura, o papel das Academias de Letras deve ser o de estimular seus membros a produzir obras que resgatem a memória de grupos e organizações, um legado histórico para as futuras gerações, entre as produções de fantasias literárias.


SOBRE O ENTREVISTADO


Luiz Antônio Cardoso é membro da Academia de Letras dos Militares Estaduais de Santa Catarina, onde ocupa a cadeira número 23. É Coronel da Reserva da Polícia Militar de Santa Catarina.




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DA SÉRIE “POETAS MULHERES” – 14 - JE SUIS POEMA






                                    [ FRIDA THALLO, UMA POETA QUE URGE]

POEMA 1              

O verso
mágico,
másculo,
deixa transparecer
o tu feminino.

Enquanto eu
- fêmea faminta –
enclausuro desejos
na moldura da sala.

[Frida Thallo, 2013, especial para Confraria da Leitura-pn]


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CAMINHO

Porque há passos errados
- não deixo o caminho certo
não traio os órfãos da terra
não largo a estrela no chão

Porque há passos que voltam
- não vou cortejar a noite
não vou negar que a sufocam
as lentas faixas da aurora

Recuso jade no colo
pedras raras nos cabelos:
caminho de pés descalços
e vestida de agapantos

Porque há passos errados
- meus passos sejam mais firmes
mais alto seja o meu canto
mais alta a estrela na mão

[Maura de Senna Pereira, A dríade e os dardos, Livraria São José, Rio de Janeiro, 1978, p. 53]


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águas medicinais

logo viajo
para o lado
que houver
lago 
rio 
mar
carinhos 
termais
[quiça
em um dia
de chuva 
intensa
eu vá
liquidar
a seca
intrínseca]
preciso
- umidamente -
afagar
as mágoas

[Valeria Tarelho, 27/07/2015, Facebook, São José dos Campos]


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HORAS FUGIDIAS

Nas horas fugidias que aparecem
Como aromas de ventos passados
Percebemos o som de rebentos
Das marés vazias de todos os lados.

Ainda procuramos e tentamos
Carícias e alentos dos amores
Sonhos emoções e cargas de anseios
Para fazer da vida um recreio.

Alternamos a direção dos caminhos
Abrimos restas de altas nuvens
Tudo será contentamento neste desejo
Como o infinito som de uma rocha.

[Vani Campos, Relicário, Somar, Porto alegre, 2014, p. 26]



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ROMANCE DOMÉSTICO

Fazer da alma
Uma nuvem.
Contar os pingos,
Pingar
Sopa de contos estelados
Sem ovos quebrados
Ou ruídos de passos.

Que fazer com os homens?
São machos apenas
Quando entram no cio.

[ Rita Raphael, Da sedução da intimidade do mundo, Cepec editora, Florianópolis, 1988, p.17]



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FLORES CIRCULARES
criar a fuga da consagração erótica
alimentar seu grande pássaro
provocar sua expressão de cervo, de lobo e de serpente
abrir o mistério do seu olho cinza
a asa adornada pela pluma viva
sabendo que o voo nunca é cerebral
pois existe entre nós um ritual xamânico
*
ouvir o crepitar do fogo
sentir o cheiro do cedro e da melissa
mergulhar num lago de vitória-régia
enquanto tento segurar os peixes e as palavras
a indefinição dos nomes
mordendo a maçã dos lóbulos das suas orelhas
comendo no espaço dos dedos o Aleph dos magos
o rumor das narrativas dos dias circulares
onde a manhã fecha-se sobre as nossas tardes
num oceano de vinho e de sorrisos
numa fonte monossilábica
num copo de amor de vidro transparente
num desejo líquido que vem do alto do Himalaia
escorrendo como a neve derretida
a ilusão do gozo
o erotismo solúvel do seu corpo
onde existem tantas mulheres
que estiveram ali antes de mim
*
sei que elas ainda se deitam no seu peito
e com sandálias de címbalos
dançam sobre uma ponte amorosa
onde passamos o tempo flutuante
ao encontro da pele
ao encontro das flores de veludo
que nascem da provocação de um jardim
permanentemente incendiado

[Célia Musilli, SP, Facebook, 30/07/2015]


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A FLUTA MUDA
(Encontro relâmpago)


na saída
tua mão agarra meu nariz
tirito ainda da ópera gelada
o comboio da dor desce pelos bairros destreinados
horas altas e a mãozinha a sacudir esse nariz
em saudação
Do vagão inexpressão viaduto
tremo sem libreto


[ Ana Cristina César, Poética, Companhia das Letras, 2013, p.213]



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O meu amor



Não é rio, o meu amor;
antes, lago.

Não corre em leito vário,
musgo, pedra, calcário.
Estanca-se em área precisa,
superfície constante e lisa.

Não se atira em corredeira,
em leviana carreira incauta.
Firme permanece. Perdura
na mais segura contenção.

Não busca paisagens diversas,
vistas de relance, às pressas.
Contempla uma única imagem,
perscruta sua íntima roupagem.

Não viaja margens paralelas,
nem a terceira nele se insinua.
Circunjaz em vítrea redoma,
em lúcido leito de luz flutua.

Abissal, em lapa profunda
mergulha o meu amor.
Deixa-se estar estático
para em si só ser:

aquoso olho da Terra a me espiar,
broquel translúcido a me guardar,
espelho onde dançam, à revelia,
as estrelas-meninas da minha alegria.

  
[Iris Guimarães Borges, via emeio/2015]





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LI E RECOMENDO (13)


ASSASSINATO AO LUAR é o novo livro de contos de Raul Caldas Filho, um dos escritores catarinenses atuais de  grande significação literária na área da prosa nacional. Também cronista de mão cheia, Raul é um daqueles escritores que costuma surpreender a cada novo projeto, a cada nova história.

Desta vez são quinze narrativas de temática variada onde as intrigas transcorrem em diferentes épocas com os personagens envolvidos em situações conflitantes ou insólitas. O leitor encontrará fortes doses de erotismo, em relatos nos quais se misturam inquietações adolescentes, paixões proibidas e amores impossíveis. Temas controversos, de ontem e de hoje, como prostituição, homossexualismo, pedofilia, violência contra mulheres, tráfico e consumo de drogas também aparecem nas tramas.

O conto que dá título ao livro tem todos os ingredientes de uma sombria história policial: uma bela jovem morta, jornalista investigativo, delegado durão, mulheres glamorosas, detetive abelhudo, mordomo enigmático e vários suspeitos. Só que toda ação desenvolve-se há luminosa Ilha de Santa Catarina e tudo é conduzido à moda brasileira.

Apesar do denso conteúdo, a linguagem do autor é fluente e receptiva (não faltando também a crítica social, o humor e a ironia) propiciando uma prazerosa leitura.

SOBRE O AUTOR

Raul Caldas Filho nasceu na histórica São Francisco do Sul (Santa Catarina) em 1940, mas se criou e fez os seus estudos na capital do Estado. É formado em Direito, jornalista, cronista e ficcionista. Como jornalista trabalhou ou colaborou com os principais jornais catarinenses a partir de 1963. Foi também repórter da revista Manchete durante dois anos (1967/1968) no Rio e correspondente da editora Bloch em santa Catarina. Já publicou onze livros, sendo sete pela Editora Insular, entre ficção, crônicas, reportagens e textos variados. Participou ainda de dezenove coletâneas.


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DA SÉRIE “EU SOU POEMA”



[Foto Júlia]




LUZ SÚBITA


Estive aqui
Mas não sei dizer como nem quando:
A grama além da porta eu já vi.
Reconheço também o aroma brando
os sons anelantes, as luzes na praia,
aqui e ali.

Sim, já foste minha antes
há quanto tempo não posso dizer.
Quando, das andorinhas aos voos rasantes,
viraste a cabeça para ver,
ah, caiu-me um véu, soube de coisas distantes.
Tudo antes então tem sido desta sorte?
Haverá na maré do tempo de novas vidas,
a despeito da morte,
luz súbita que restaura passados momentos de amor,
bem como dias e noites de vivência forte?



[ Dante Gabriel Rossetti. Tradução livre de Silveira de Souza, especialmente para Confraria da Leitura-pn]




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DA SÉRIE “CRÔNICAS, CONTOS E OUTROS TANTOS”







[Grafiteiro surfista]



FEBRE

acostumou-se a conversar com tudo e qualquer coisa. com gente morta, gente que não existe, gente que existe e não se importa. com espelhos, paredes, vidros de perfume. com uma boneca de louça francesa, sem o olho direito, presente de seu pai. com ela mesma, às vezes. com seus botões, a toda hora. com os cheiros antes de senti-los. com um corisco riscando a pele antes da tempestade. com os pés de barro de um homem impossível. com histórias que não eram as dela.
e tudo era tão triste antes que descobrisse uma fresta no teto. e o voleio úmido das asas de algum anjo caído não se sabe de onde. 
tudo era tão triste, e mais triste, agora: 
com a febre e o dedo entre as pernas escalando a solidão.

 [Mariza Lourenço, 22/08/2015, Face book]


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DA SÉRIE “NOSSA LÍNGUA”








Você sabe por que...?

1-    Você sabe por que dizemos alô! assim que atendemos ao telefone? Se não sabe, eis por quê: na França, no século passado, quando se começou a utilizar o telefone, dizia-se “allons” (depressa, vamos logo), à retirada do fone do gancho. A palavra pedia pressa, mas ela mesma era demasiado longa (o som nasal a alongava demais). Passou-se, então, a dizer apenas alô! E assim ficou.



[ Luiz Antônio Sacconi, Gafite, nº. 1, abril 1987, Nossa Editora, p. 25]


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DA SÉRIE  “PARA [SÓ]RIR E NUNCA TENTAR”

  
Gostaria de dividir minha experiência com vocês que bebem e dirigem mesmo assim.
No último sábado à noite, não sei quantas cervejas eu bebi.
Sabendo que não estava legal, fiz algo que nunca havia feito antes: deixei meu carro no estacionamento e peguei um ônibus.
Resultado: cheguei em casa a salvo, sem nenhum incidente e com ótima sensação do dever cumprido...
Agora, o que me causou grande dificuldade foi estacionar, pois eu nunca havia dirigido um ônibus na minha vida!

kkkkkkkkkkkkk


[Autor desconhecido Face book 2014]

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DA SÉRIE “POEMAS VISUAIS”








[Pinheiro Neto, Poema visual, Iriamar]



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[Fátima Queiroz, Poema Visual]




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O MELHOR LIVRO DE POEMAS QUE ESCREVI POUQUÍSSIMOS PODERÃO LER NESTA VIDA.
ELE ESTÁ IMPRESSO NO MEU CORAÇÃO! E TU, COM CERTEZA ESTÁS LÁ, EM TODOS
OS VERSOS QUE NÃO FORAM PUBLICADOS.

(Pinheiro Neto)




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CONFRARIA DO [meu] POEMA-pn




A chuva
encharca
lembranças
nonagenárias.

Braços imóveis
sequer mudam
o canal da tv.
  
(Pinheiro Neto, 90 e tantos, inédito, março 2013)   






sexta-feira, 17 de julho de 2015

Edição nº. 73

PAPO NA CONFRARIA:





PAULO BERRI


1-   O que te motiva a escrever?

Caro amigo Pinheiro Neto, a primeira justificativa que me vem à mente é a vontade de extravasar a criatividade latente e presente desde a mais tenra idade.  Muito jovem ainda, apaixonei-me pela poesia e hoje tenho exatos 1.039 poemas e 367 frases, além de contos, crônicas e parábolas.  Com um pouco mais de maturidade, hoje sinto o desejo de compartilhar reflexões voltadas para os quesitos filosóficos, psicológicos e sociológicos da vida e é neste sentido que se encontra no prelo, o primeiro livro em prosa.  A escrita nos proporciona uma viagem pela imaginação, como não encontro em nenhuma outra arte e é nesse bailar ao som das frases e versos, que procuro me deleitar, tanto na composição poética, quanto na prosaica.  A leitura, tanto quanto a composição, é passaporte barato e que nos dá direito a conhecer, culturas, personagens (fictícios ou não) e os países mais diversos, sem sequer sair do lugar.


2-   Cite os TRÊS livros (e respectivos autores) mais significativos em tua vida?

- O primeiro, ainda adolescente, foi um dos que me despertaram o desejo de escrever “Memórias de um agente secreto” de Maria de Lourdes Ramos Lock
- Na Juventude “O Alquimista” de Paulo Coelho, mostrou-me uma forma simples de se chegar ao coração do leitor e assim como conquistou boa parte do mundo, o fez a mim também.
- E finalmente “Veias abertas da América Latina” de Eduardo Galeano, não pelo aspecto literário, que certamente não era brilhante, mas por apresentar o mundo verdadeiro a um jovem e idealista estudante universitário.  Este livro abriu o Véu de Ísis e me mostrou a dura realidade do mundo e das pessoas, sem tirar da retina, a esperança e muito menos o otimismo.


3-   Indique um livro (Literatura Brasileira) para leitura de:

a)        Alunos do Ensino Fundamental (5ª a 8ª séries):

Memórias de um agente secreto – ver acima

b)        Alunos do Ensino Médio:

Memórias póstumas de Brás Cubas – Machado de Assis

c)        Alunos do Ensino Superior:

O Poder do aqui e agora – Eckhart Tolle

4-   Como se dá o processo da escrita em tua prática cotidiana?

Essa resposta é bem tranqüila.  Sou impulsionado basicamente pela inspiração.  Meus poemas duram na média entre dez a quinze minutos, fora aquele burilamento necessário.  Agora que estou me dedicando mais à prosa, a qual imaginava necessitar mais da transpiração do que da inspiração, percebi que estava equivocado e, por conseguinte, satisfeito por poder exercer nos dois estilos (poesia e prosa) a mesma receita.


5-   Fale sobre o apoio dispensado pelos setores público e privado à literatura.

Temos nas três instâncias, federal, estadual e municipal, ferramentas de apoio à literatura, como a Lei Roaunet por exemplo.  Em contrapartida, temos Leis que estão apenas no papel, como aquela que obriga o município a adquirir, via processo específico, obras de autores florianopolitanos de autoria do ex-vereador Sérgio Grando, apenas pra citar uma delas.  Na instância privada a dificuldade é ainda maior, pelo simples fato de que esta modalidade dá pouco retorno aos empresários.  Geralmente acontece o apoio privado na escala de amizades pessoais.  Muito há que ser feito nessa área!


6- Fale sobre o papel das Academias  de Letras em relação à Língua e à Literatura?


As academias, bem como algumas associações literárias mais organizadas, têm o papel fundamental de disseminar a literatura e de despertar o gosto por ela.  Um dos terrenos férteis pra isso são as visitas às escolas, a doação de livros a bibliotecas, o uso dos concursos literários e outras ações.  Nisso, temos algumas agremiações mais produtivas que outras.  Quanto à língua em si, creio que fica destinado à instância superior desta escala, ou seja, restrita à Academia de Letras do Brasil.



SOBRE O ENTREVISTADO

Autor de quatro livros de Poemas, contos e reflexões, com o primeiro em prosa no prelo.  Teve o prazer de palestrar nos Açores/Portugal sobre a literatura catarinense.  Participante de diversas antologias, tendo sido agraciado com alguns concursos literários.  É membro das Acad. Catarinense Letras/Artes – ACLA (cad. 20) e ASAJOL (cad.17) e das assoc. ACPCC, Letras no Jardim e Leitores em Floripa, participando eventualmente do GPL e GPT.
Descrição: https://ssl.gstatic.com/ui/v1/icons/mail/images/cleardot.gif






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DA SÉRIE “POETAS MULHERES” – 13




[Renda de bilro confeccionada por Sivonei Gonçalves]



JE SUIS POEMA





BAILADO

Eras estrela, eras ave, eras
grande flor aberta
sobre o peito do homem?

Em verdade parecias
em teu bailado, Raissa,
um pássaro
pousando sobre aquele tronco
pousando e, no entanto, pronto
para voar.

Em verdade eras um símbolo
em teu bailado, Raissa,
pois no mesmo dia
surgia uma era nova
e da tua terra voava
uma nova lua
para no céu bailar.

[+ MAURA DE SENNA PEREIRA, A dríade e os dardos, Livraria São José, Rio, 1978, p.57]

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"LOucomotiVE-se"

tire
o coração
dos trilhos
meu bem


que o trem
da vida
é bala


seu tiro 
enlouquecido
pode pegá-lo
dormindo


[Valéria Tarelho] (Face/29/06/2015)


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flores do mais


devagar escreva
uma primeira letra
escrava
nas imediações construídas
pelos furacões;
devagar meça
a primeira pássara
bisonha que
riscar
o pano de boca
aberto
sobre vendavais;
devagar imponha
o pulso
que melhor
souber sangrar
sobre a faca
das marés;
devagar imprima
o primeiro
olhar
sobre o galope molhado
dos animais; devagar
peça mais
e mais e
mais

[ + ANA CRISTINA CESAR, Poética, Companhia das Letras, São Paulo, 2013, p.209]


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FUNDO DOS TEMPOS

Vem, vem do fundo dos tempos
traz em tuas mãos claras e leves
transpondo neves
um ramo verde de álamo

vem, vem do fundo dos tempos
conduzindo
na alma e no coração ágil e puro
o frescor de um mundo amanhecente

Vem, vem do fundo dos tempos
e desnuda-te, inocente.

[VANI CAMP0S, Relicário, Porto Alegre, Somar,2014, p.25]



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SEM PRAZO DE VALIDADE


Desisti das rimas pobres de amores.
Quero 
a festa dos 
licores,
sabores,
suores,
sussurros vorazes
sem prazos de validade
ou relógios a tiquetaquear.

A realidade em meus poros,

hera a recobrir nossos corpos
em simbiose de amor.
Devaneios!

©rosangelaSgoldoni
19 08 2014
RL T 5 304 195







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LI E RECOMENDO (13)







Desvios é, sem dúvida, uma das excelentes produções na área do conto surgidas no estado (e porque não dizer, no  país) este ano. São apenas três histórias:  As gêmeas, O aposentado e As três coroas, e uma melhor do que a outra.

Editado pela autora, o livro apresenta o projeto gráfico e a editoração eletrônica impecáveis, a cargo da Alvo Design e a capa muito bem bolada, discreta e de uma beleza singular. Aliás, as orelhas  trazem uma inovação muito interessante,  o texto, assinado pelo escritor Flávio José Cardozo, está impresso na parte interior delas. Ao leitor desavisado  fatalmente passará despercebido caso não a desdobre e perceba-o lá.

O texto de Flávio José Cardozo  acaba sendo também a própria apresentação do livro, já que nada mais há entre a página da ficha catalográfica e o início do primeiro conto – o maior – As gêmeas.  Trata-se de uma análise extremamente precisa do que são os três contos de Iris Guimarães Borges. É por isso que resolvi transcrever aqui o texto em sua íntegra. Até porque eu não teria condições de fazê-lo melhor.

“ Aqui estão três histórias narradas na primeira pessoa (duas por mulheres e uma por um homem) nas quais nossa autora exibe sutilezas da memória alheia num palco enriquecido com suas lembranças próprias. Embora ela não diga os lugares em que cada ação acontece, a alusão a certos costumes e mesmo o emprego de certas palavras deixam clara a herança mineira trazida de Araxá, quando aos 24 anos, recém-casada, ela veio para Criciúma. Mas esse é o lado mais exterior de Desvios, de resto todo construído com boa técnica e uma fluência que prende. Sobressaem, mais que tudo, nos três relatos a força da sondagem psicológica, o domínio do tempo ficcional, a pulsação das rotas e retas que se quebram e nos oferecem sentimentos.

No primeiro conto, temos duas gêmeas em confronto. Maria Inês e Inês Maria, mais que individualidades, são duas metades que não se ajustam e se pertencem. Maria Inês conduz a linha do conflito, é dela a consciência dolorosa do vínculo. Odeia as roupas tantas vezes iguais, os agrados açucarados dos que, pelos 65 anos já vividos, as veem juntas, despreza a dependência da outra, aquela cara de lerda, a presença grudenta, a virgindade ridícula. “Minha irmãzinha”, ela repete, e lembra quando brincavam de se olhar lado a lado no espelho, as duas, as quatro, embaralhadas. Se ao menos Inês Maria tivesse uma cicatriz... Nesse jogo de imagens ambíguas, o leitor é chamado a um labirinto de que também é boa metáfora a guerra das almofadas, quando já não sabiam quem era a irmã de cá e a irmã de lá e qual delas asfixiava a outra.

Em “O aposentado”, o homem metódico é surpreendido pela ruptura dos hábitos e pelo tédio. Mas é criativo. Com a boa memória que tem e o gosto pelos cálculos, logo inventa o que fazer. Põe-se a contar o mundo que lhe sobra: as travessas das janelas, os azulejos do banheiro, os cantos do pintassilgo. Há uma poesia amarga no desdobrar dos seus passos de sobrevivente, na sugestão que lhe dão de visitar os amigos.

No terceiro conto vem a experiência de Ieda. Sua amizade com três vizinhas mais velhas (ela então 17 anos, as três irmãs sessentonas) flui em dez pequenos capítulos, com um introito de poucas linhas que fala em crime perfeito. Todos estranham o relacionamento assimétrico, não entendem o prazer da moça em falar sobre livros com Adélia, sobre licores e doces com Berenice, em aprender bordado com Cecília. Conversam. A distância dos anos, o que é isso? As quatro passeiam, Ieda não diz o nome da pequena cidade inesquecível, mas sabemos que é em Araxá, aquela por cujas mulheres o poeta dava o seu reino.”


SOBRE A AUTORA, PELA PRÓPRIA

Nasci na noite gelada de 29 de abril de 1945, na pequena  Araxá, cidade que primeiro vê o sol. Filha de Altino Guimarães e Níobe Neves Guimarães, das duas famílias herdei a rigidez de caráter, a intransigência e o gosto por ensinar. Mas, antes de ensinar, é preciso aprender. Recebi uma primorosa educação formal – hoje, mais do que nunca, sei disso -, cursando o Primário no Grupo Escolar Delfim Moreira, o Ginasial e o Normal no colégio São Domingos. Nessas duas instituições, lecionei antes de me casar com Ruiter Antônio Borges e vir morar em Criciúma, onde encontrei espaço e acolhida para realizar todo o meu  plano de vida: criar meus dois filhos, Nicole Guimarães Borges  Medeiros e Ruiter Guimarães Borges, fazer o Curso de Letras na então Fucri e ali lecionar Literatura Brasileira, fundar minha própria escola, o CALLP, e participar da fundação da Academia Criciumense de Letras, na qual ocupo a cadeira 19.
   


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DA SÉRIE “EU SOU POEMA”




[Arte no Café por Michele Espíndola]



O POEMA


Tudo
está no som. Uma canção.
Raramente uma canção. Que deverá
ser uma canção – feita de
minúcias, vespas,
uma genciana – alguma coisa
imediata, tesoura aberta,
olhos de mulher – a despertar
centrífuga, centrípeta.


[ WILLIAN CARLOS WILLIANS. Tradução livre de Silveira de Souza, especialmente para Confraria da Leitura-pn]




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DA SÉRIE “CRÔNICAS, CONTOS E OUTROS TANTOS”




[Autor não identificado]


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DA SÉRIE “NOSSA LÍNGUA”








GAFES TELEVISIVAS

Bons fluídos

Fluido é palavra que rima com circuito, gratuito, intuito, fortuito. A tonicidade, portanto, está no u, e a palavra nãotraz acento gráfico.

Vejamos, porém, o eu disse um locutor de televisão certa feita:

O Palmeiras terminou o segundo turno emanando bons fluídos para a coletividade alviverde.

Os fluidos que o locutor emanou foram tão negativos, que a consequência foi que o todos viram: o Palmeiras perdeu o título do campeonato paulista para um time do interior – primeira vez na sua história -, perdeu o campeonato brasileiro e genhou um Mirandinha – pelo jeito – para sempre...


 [ Luiz Antônio Sacconi, Gafite, nº. 1, abril 1987, Nossa Editora, p. 15]


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DA SÉRIE  “REPASSANDO”







A SENSIBILIDADE SOMBRIA


Conhecia o trabalho da artista plástica alemã Unica Zurn (1916/ 1970) por sua ligação com o Surrealismo. Suas obras apresentam formas pontilhadas ou fragmentadas, uma leitura pictórica de quimeras, animais fantásticos, conteúdos bizarros, imagens bipartidas, desenhos que empurram os corpos para fora dos limites. A fragmentação de sua obra remete à sua condição de esquizofrênica, expressão que significa "partida", "dividida" e se caracteriza pela perda de contato com a realidade. O que eu não sabia é que Unica Zurn deixou também uma obra literária significativa, cerca de 140 contos publicados na imprensa alemã nos anos 40, além de um livro de anagramas (Hexentexte/ Texto de Bruxas (1954), e o livro autobiográfico "O Homem-Jasmim" dedicado a Henri Michaux por quem ela foi apaixonada. Esse livro, publicado postumamente em Paris em 1971, tem uma tradução em português da Editora & ETC (Lisboa), mas não o encontrei nos sebos virtuais do Brasil e, se encontrasse, possivelmente custaria uma pequena fortuna, tendo em vista que alguns livros de Michaux, publicados pela mesma editora, estão cotados hj a preços que ficam entre R$ 350,00 e 500,00 em lojas de usados.
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Unica Zurn teve um longo relacionamento com Hans Bellmer, artista alemão conhecido por suas fotografias e uma impressionante coleção de bonecas mutiladas. Seus principais temas eram a alucinação e os aspectos subconscientes da sexualidade. É conhecida a série fotográfica que fez de Única Zurn em que ela aparece em poses sadomasoquistas, nos quais seu corpo é amarrado fortemente por cordões que marcam e distorcem as formas. Dizem que Bellmer direcionava suas pulsões sádicas para a arte e foi o grande protetor de Unica quando ela, em fases de alucinação, tornou-se incapaz de lidar com os marchandes. Ficaram juntos até a morte de Única, quando a artista, em 1970, suicidou-se atirando-se da janela do apartamento de Bellmer em Paris sem que ele pudesse fazer nada porque estava inválido, numa cadeira de rodas, e só pode presenciar o ato extremo.
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A vida de Unica, apesar de sombria, resultou em iluminações que podem ser apreciadas em sua obra, nas quais uma estética convulsionada é tb demonstração de sua enorme qualidade artística. De alguma forma, ela conseguiu, como afirma em seu livro autobiográfico "O Homem-Jasmim", colocar-se "no centro dos acontecimentos", ainda que muitas vezes de forma trágica. Entre outros, foi uma artista acolhida pelo Surrealismo, primeiro movimento a assumir a "obra dos loucos" como obra.

(Célia Musilli)

Há uma biografia mais completa de Unica Zurn no blog da autora, num artigo da revista Saúde Mental:


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DA SÉRIE “POEMAS VISUAIS”



[ Ondas, poema visual Pinheiro Neto/Chrischelle]


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[Poema visual de Fátima Queiroz/SP]




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O MELHOR LIVRO DE POEMAS QUE ESCREVI POUQUÍSSIMOS PODERÃO LER NESTA VIDA.
ELE ESTÁ IMPRESSO NO MEU CORAÇÃO! E TU, COM CERTEZA ESTÁS LÁ, EM TODOS
OS VERSOS QUE NÃO FORAM PUBLICADOS.

(Pinheiro Neto)


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CONFRARIA DO [meu] POEMA-pn









TEÇO O POEMA
COMO BOM GURMÊ
QUE ELABORA O PRATO:
SO (E) MENTE ESPECIARIAS.

SORVO O POEMA
COMO BOM GLUTÃO
QUE DEGUSTA VERSOS:
SO (E) MENTE POESIA.


(Pinheiro Neto, Degustação poética, inédito, agosto 2013)