MUDANÇA
Flávio José Cardozo
Eis aí: depois de tanto aperto, a casa
própria. Miudinha, arretiradinha, financiadinha por vinte anos, mas própria.
Adeus, aluguel. Adeus, infeliz mudança quase todo ano.
O caminhão já veio. É um caminhão comum, dos
pequenos, mas pra que melhor e maior se é tão pouco o que vai ser levado, se é
tão curta a viagem do Saco Grande para o Roçado?
- Não vai caber tudo – diz a mulher.
- Dá e sobra – responde o marido.
- Pois tomara que dê.
Começa o carregamento. O marido e o
motorista, com a ajuda de um guri da vizinhança, cuidam do mais pesado –
guarda-roupa, cama do casal, cama da sogra, armário, fogão, mesa, cadeiras,
geladeira. Um trabalhão. Mas um trabalhão gostoso – é a última mudança na vida,
se Deus quiser. A mulher arruma as miudezas, entrouxa as roupas, empilha pratos
e xícaras. A mãe dela descansa numa espreguiçadeira, convalesce duma zipra na
perna. É uma senhora gorda, que se abana
sem cessar, toda encalorada.
- Não vai caber tudo não – insiste a mulher,
quando quase todos os trecos grandes foram ajeitados no caminhão.
O homem coça a cabeça, pois de fato o espaço
é pouco e ainda faltam alguns objetos de certo porte, como o fogão, o botijão
de gás, as cadeiras. Olha as miudezas, olha a sogra imensa e começa a acreditar
que vão ter problemas.
Sobem, por fim, os trens que faltam, sobem as
roupas, as panelas, os pratos, a gaiola do coleira, as vassouras, os quadros de
santos. Sobe até, sem muita discrição, um objeto branco e intrigante, um urinol
de propriedade da sogra – intrigante porque até hoje o genro não entende como é
que num tal tamanhinho pode se sentar um tal tamanhão. Mas enfim...
Enfim, com mais algumas bugigangas, o
caminhão se empanturra de não se agüentar de pé. Nele, nem mais um alfinete. Ou
melhor: ainda conseguem encarapitar sobre tudo a espreguiçadeira.
E agora a questão: e eles vão onde? Porque o
plano tinha sido este: a sogra, com seus três metros de fundos, ia na frente
com o motorista; o casal, na esportiva, lá em cima.
- Eu não disse que não cabia? – fala a
mulher, vitoriosa.
- Paciência. Ninguém morre por isso. Tua mãe
vai com o motorista. Nós vamos de ônibus.
O quê? A mulher não aceita. Nunca que a mamãe
vai sozinha por aí com um desconhecido. Decide ir com ela.
-
Mas como? O caminhão vai sem motorista?
A mulher é teimosa. Ajeita a mãe, acomoda-se
em cima duma perna dela, obriga o motorista a ficar na pontinha do banco – um
perigo. Mas deu. Parece que deu.
O homem fica olhando o caminhão se indo, meio
de banda. Está feliz, ri sozinho: nunca pensou que tivesse tanto na vida.
(Do livro Uns
papéis que voam)
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O REINO DOS ESQUECIDOS
Este
é o novo romance do escritor MIRO MORAIS, autor de dois sucessos de mídia e de
venda no país e no exterior, A coroa no
reino das possibilidades e Cândido assassino, a ser lançado ainda este ano
pela editora Insular.
O
romance está estruturado em oito capítulos que sobrevivem por si só mas são
costurados pela história do Barão de Vinhedo, Dom Manoel Manso, personagem
central. São eles: Início da aventura; Rumo ao desconhecido; A construção dos
sonhos; Um novo olhar; Origem de Mariano Paixão; O amor de Fábio Paixão; O reino
ameaçado e Início final.
Dom
Manoel manso, um fidalgo muito próximo ao Imperador, por razões misteriosas,
abandona a corte no Rio de Janeiro e se lança à aventura de criar no Sul do
Brasil um povoado onde as pessoas possam ser felizes. Para realizar o seu sonho
não lhe basta dominar a natureza hostil e fascinante e aprender a conviver com
ela. O seu projeto entra em conflito com as crenças e as regras, a ordem e a
desordem e o Poder que reina sobre tudo e todos. E isso se transforma em mais
uma ameaça para o seu plano e a sua vida.
Mas
a determinação de Manoel Manso não tem fronteiras. Aos poucos ele atrai para
sua idéia, vista como visionária, sobretudo, os que nada tinham. Nem bens
materiais nem esperanças. E, logo, também os ambiciosos de riqueza e poder. E
tudo vai se transformando em um universo com alma própria.
Pequenos
e grandes heróis expõem suas paixões, seus ódios, seus amores, a traição e a
solidão, suas esperanças, tristezas e alegrias. As suas múltiplas histórias se
entrelaçam – em capítulos que se auto justificam – dentro de um enredo maior,
onde convivem os aventureiros e os acomodados; os santos e os assassinos.
Para
Dom Manoel Manso o ser humano é o seu santo e o seu demônio. E, dentro dele,
perde o que ele conseguir mais fragilizar. E é esse desafio da liberdade que
ele próprio, cada um dos moradores do lugar que fundou e o país se deparam
todos os dias, todos os momentos, que o desencanta e fascina.
Só
para lembrar, Miro Morais, um dos grandes nomes da literatura catarinense e
brasileira concorre à cadeira número 20 da Academia Catarinense de Letras.
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11ª MOSTRA DE CINEMA INFANTIL
O Fim do Recreio, de Vinicius Mazzon e
Nélio Spréa, do Paraná, é o grande vencedor da 11ª Mostra de Cinema Infantil de
Florianópolis. O curta foi escolhido pelo Júri Oficial e pelo voto do público
infantil. Disque Quilombola, de David Reeks, de São Paulo, ganhou
Menção Honrosa do Júri. Cada um dos filmes recebe um Prêmio Aquisição no valor
de R$ 10 mil da TV Brasil. O Destaque Especial do Júri foi para o
curta Rap Consciente, realizado por alunos da Escola Amenóphis de
Assis, do Espírito Santo. O anúncio dos vencedores vai ser realizado na tarde
deste domingo, às 16h, antes do show Cante com o Peixonauta no Teatro Pedro
Ivo, no encerramento da Mostra.
O Júri Oficial foi
integrado pelo diretor da série de animação infantil Meu AmigãoZão, Andrés
Lieban, pela produtora Patricia Alves Dias e pela cineasta
Patricia Monegatto. Eles justificam a escolha do curta O Fim do
Recreio “pela sua inventiva construção narrativa que valoriza com
humor, delicadeza e sensibilidade o ponto de vista da criança, protagonizando
seus próprios dramas, sem perder a sua natureza espontânea”. No filme, crianças
de uma escola se unem para mudar um projeto de lei que pretende acabar com o
recreio escolar.
Sobre a Menção Honrosa
concedida a Disque Quilombola, os jurados argumentam que
documentários são comumente realizados sobre crianças e não para crianças. No
caso deste curta, avaliam, é possível cumprir a dupla façanha de fazer
documentário sobre crianças, afirmando seus espaços, e revelando para outras
crianças seus próprios mundos, usando a linguagem universal da brincadeira. “O
filme é uma obra política, um olhar etnográfico apurado que dialoga com os
mundos adulto e infantil do nosso vasto país”, escrevem os jurados na
justificativa do voto.
O destaque para o Rap Consciente é uma
referência especial pela relevância do crescimento quantitativo e qualitativo
de conteúdos audiovisuais realizados por crianças e jovens. Na edição da Mostra
deste ano, concorreram 88 produções de todo o Brasil, que foram exibidos
ao longo de 17 dias de programação.
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SAUDADE
Quando chegares, saudade,
No desdobrar da vida,
- nem vivida –
Eu te divisarei, lá longe,
No barco parado, sem vela,
Boiando no mar sem verão
- nem procela –
Parado em ti.
Quando chegares, saudade,
Na noite amanhecida,
- nem dormida –
Eu te avisarei, de longe,
E abrirei os braços, no abraço
Da coisa conhecida
- e já perdida –
No meu entardecer.
(Mila Ramos, Sete Sumos, Ed. Sanfona, 1985)
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PALÍNDROMO: VOCÊ SABIA?
Um palíndromo é uma palavra ou um número que se lê da mesma maneira nos dois sentidos, normalmente, da esquerda para a direita e ao contrário.
Exemplos: OVO, OSSO, RADAR. O mesmo se aplica às frases, embora a coincidência seja tanto mais difícil de conseguir quanto maior a frase; é o caso do conhecido:
SOCORRAM-ME, SUBI NO ONIBUS EM MARROCOS.
Diante do interesse pelo assunto (confesse, já leu a frase ao contrário), seguem alguns dos melhores palíndromos da nossa língua:
Um palíndromo é uma palavra ou um número que se lê da mesma maneira nos dois sentidos, normalmente, da esquerda para a direita e ao contrário.
Exemplos: OVO, OSSO, RADAR. O mesmo se aplica às frases, embora a coincidência seja tanto mais difícil de conseguir quanto maior a frase; é o caso do conhecido:
SOCORRAM-ME, SUBI NO ONIBUS EM MARROCOS.
Diante do interesse pelo assunto (confesse, já leu a frase ao contrário), seguem alguns dos melhores palíndromos da nossa língua:
ANOTARAM A DATA DA MARATONA
ASSIM A AIA IA A MISSA
A DIVA EM ARGEL ALEGRA-ME A VIDA
A DROGA DA GORDA
A MALA NADA NA LAMA
A TORRE DA DERROTA
LUZA ROCELINA, A NAMORADA DO MANUEL, LEU NA MODA DA ROMANA: ANIL É COR AZUL
O CÉU SUECO
O GALO AMA O LAGO
O LOBO AMA O BOLO
O ROMANO ACATA AMORES A DAMAS AMADAS E ROMA ATACA O NAMORO
RIR, O BREVE VERBO RIR
A CARA RAJADA DA JARARACA
SAIRAM O TIO E OITO MARIAS
ZÉ DE LIMA RUA LAURA MIL E DEZ
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NOVÍSSIMOS (Escritores)
Em
tempos passados, acelerava os passos, gastava quase o dobro do tempo
acreditando numa saborosa ingenuidade.
Mas
nada era verdade!
O
tempo foi passando e meus dias foram se arrastando, mas ainda podia sentir que
algo no âmago ia se transmutando.
Ainda
podia querer!
Sentia
que a vida dilacerava minhas visões, não conseguia encontrar vias na dita
dilaceração.
Em
tempos passados, acreditava ter encontrado a base de tudo que se me fazia
amargo.
Acordava
em desespero danado!
Buscava
conforto na crença de algo intocável, algum sentido favorável, mas era em
tempos já passados.
Já
não podia mais saber!
Não
sabia do que precisava, não sabia dizer, gritar, pedir, objetivar nem ao menos
queria crer.
Mirava
a foto de alguém que podia me entender, mas isso também não era verdade. Não
queria mais crer.
Agora,
passo pelo tempo com o mesmo prazer de outrora, já não corro nem grito, agora
sei o que fazer:
Esquecer!
(Tempos passados/Mirkin-2010)
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CONFRARIA DO POEMA (PN)
Teu
olhar
-
vôo de gaivota –
meu
guia.
Solto,
navega
em teu seio
meu
fantasma: solidão.
Flor
primária
ou
botão
último
de outono?
Teu
beijo
-
sal de rio –
esconde
o concreto
de
tênue relação.
(Fugaz
relação, Ciclo dos Olhos, p. 21)
Um abraço para Flávio José Cardoso, abraço velho esperando a vez. Tu continuas escrevendo lindo com gosto de ilha, mar, sol e lua.
ResponderExcluirSaudade comprida.........
Mila